Quatro mulheres, filhas adotivas, se conhecem nas redes sociais e passam a lutar pelo mesmo propósito, cada uma dentro da sua área de atuação, de acordo com a sua formação profissional: garantir que os filhos adotivos tenham acesso às suas origens, rompendo tabus históricos em relação a temática e evitar que futuros adotivos cresçam sem referências. Juntas criam a Associação Brasileira de Pessoas Adotadas para ajudar na proteção dos adotivos e de suas famílias de origem, que ficam à margem da rede de proteção. No mês da adoção essa foi a temática trazida pela Frente Parlamentar de Apoio à Adoção, coordenada pelo deputado estadual Caio França (PSB). A abertura contou com a participação de Juliana Marra da Angaad (Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção).
A jornalista Larissa Alves, destacou a importância de se desenvolver uma política nacional de adoção pensada por e para os adotivos. “Querer ter acesso a sua história de vida não é ter um gesto de ingratidão com os pais adotivos pois não estamos dizendo que a pessoa irá estabelecer vínculos com a família biológica necessariamente, é mais do que isso, é dar a ela o direito de conhecer a sua história, caso seja de seu interesse pessoal. Por isto é importante diferenciar biografia de parentalidade. Quando se torna filho (a) pela via da adoção fica inviável apagar a palavra adoção da sua vida”, reforçou.
Idealizadora do projeto Olhar Adotivo nas redes sociais, Larissa afirmou ainda que existe um preconceito muito grande acerca dos filhos adotivos que buscam informações sobre a família biológica, como se a sua adoção não tivesse dado certo ou como se ele não tivesse recebido amor suficiente da família adotiva. “Precisamos desmistificar isso. Você pode amar os seus pais adotivos e desejar ter acesso a sua biografia antes da adoção, com o intuito de preservar a sua história e a sua cultura. Existem muitos benefícios nessa busca, isso pode ajudar no preenchimento de lacunas psíquicas”, acrescentou.
A advogada Gisele Assis destacou o pioneirismo da Frente da Alesp em debater o direito às origens. Gisele reforçou o contexto histórico-cultural que envolve a adoção, reforçando que o tabu traz negligências que se perpetuam, gerando ruptura, trauma, silenciamento, gratidão compulsiva, apagamento de gênero, entre outros. “É um erro o adotivo sentir angústia em ter contato com a verdade. É um direito dele ter acesso as suas memórias. E a ausência de políticas públicas reflete na não efetividade desses direitos dos adotivos que muitas vezes passam uma vida sem saber que são filhos por adoção. O pacto do silêncio esconde as falhas estruturais do Estado nesse processo”, acrescentou.
Já a conselheira tutelar Fernanda Tuna explicou que a tríade da adoção é composta pelo filho adotivo (protagonista), a família de origem e a família adotiva (os adotantes) e que o cenário ideal é de que a rede de proteção pudesse amparar essa tríade, o que não acontece na prática, fazendo com que os adotivos e as famílias de origem não consigam ser cobertos pela rede.
Gessica Pires, graduanda em Psicologia pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro e mediadora de grupos de apoio a pessoas adotadas, abordou os impactos à saúde mental em uma sociedade não informada pela adoção, ressaltando a dificuldade dos profissionais da saúde e da educação, por exemplo, em realizarem esse acolhimento. “Não dá pra olhar a adoção como um processo isolado, ela é perene, o adotivo vai ter de lidar com as repercussões a vida toda. No ano de 2024 não há espaço para dificultar o acesso ao processo de busca às origens pelas famílias adotivas, esse silêncio precisa ser quebrado e todos os preconceitos superados”.
Caio França enalteceu a importância do trabalho das participantes que inovaram ao propor a discussão de um tema no segmento de adoção que poucos querem falar. “Escolher não falar, omitir ou silenciar nunca será uma boa opção quando estamos falando de vidas, de seres humanos, cada qual com a sua história, com o seu passado. É preciso quebrar alguns estigmas e paradigmas, vencer preconceitos. É preciso falar abertamente. O diálogo é sempre o melhor caminho na mediação dos problemas”, finalizou.
Ao final da audiência, os participantes foram prestigiar a exposição “Adoção não tem raça, tem Cores” no Espaço Heróis de 32, organizada pelo Grupo Maternizar de São Vicente, do litoral paulista, em comemoração ao Dia Nacional da Adoção.